Relacionamento Consumidor
Proteção ao Direito do Consumidor de Serviços de Saúde e Obrigação no Fornecimento de Medicamento pela Operadora do Plano
Algumas operadoras de planos de saúde persistem na prática de impor restrições no fornecimento de medicamentos de alto custo alegando que não há permissão contratual para o uso fora da bula e/ou experimental fundados em regras específicas as operadoras de plano de saúde, apesar do contrato estabelecer o fornecimento do medicamento na eventualidade de existir outras patologias nefastas e indesejáveis que, estas sim, estariam descritas na bula o que representa abuso de poder e infração ao Código de Defesa do Consumidor que se sobrepõe a qualquer regulação setorial, conforme reiteradamente decidido pelos nossos Tribunais.
Para melhor ilustrar tal posicionamento, segue trecho do Acordão proferido nos autos de Apelação n. 1040545-08.2018.8.26.0506 perante a 6º Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo pelo Desembargador Marcus Vinicius Rios Gonçalves que discorre sobre o tema de acordo com precedentes do TJSP e STJ:
“ O medicamento indicado na inicial foi aprovado pela ANVISA. A relação que se estabeleceu entre as partes, por força do contrato celebrado é de consumo. O Código de Defesa do Consumidor é norma de ordem pública, que se aplica a todas as relações de consumo, inclusive as decorrentes da contratação dos planos de saúde, nos termos da Súmula 608 do Superior Tribunal de Justiça. No mesmo sentido, a Súmula 100 deste Egrégio Tribunal de Justiça. A ré recusou-se a promover a cobertura do tratamento do autor, expressamente indicado pelo médico que o assiste, alegando que o medicamento não está incluído no rolda ANS, sendo o uso “off label”.A exclusão da cobertura afronta o princípio da boa-fé contratual, já que no momento da contratação a fornecedora acena com a perspectiva de dar cobertura aos tratamentos necessários ao paciente, inclusive os mais modernos, atraindo o consumidor, que, no entanto, se vê desprotegido quando necessita efetivamente de tratamento. O autor padece de síndrome nefrótica, e a doença possui cobertura contratual. Assim, também deve haver cobertura para todos os medicamentos necessários para tratá-la. Excluir a cobertura do medicamento seria privar o autor de receber o acompanhamento adequado para a sua doença, que tem cobertura contratual. Irrelevante que o remédio não esteja incluído na lista da ANS, sendo aplicável o disposto na Súmula 102 deste E. Tribunal: “havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS”. A requisição médica foi juntada a fls. 42/43.”(fls.425/426)
Em complementação, após verificação de outras decisões judiciais semelhantes, tal posicionamento vem sendo aplicado não somente em relação ao medicamento MABTHERA, que pode ser utilizado para outras moléstias, mas também em relação a outros medicamentos, cujo rol exemplificativo segue:
1) medicamento infliximabe (remicade);
2) medicamentos Temodal (Temozolamida) e Avastin (Bevacizumab);
3) medicamento Enoxoparina/Clexane;
4) medicamento POMALIDOMIDA;
5) medicamentos Revlimid (lenalidomida) e Dexametasona (Zometa);
6) medicamentos Regorafenibe 160MG E Nplate 250MCG/0.5ML;
7) medicamento “Lenalidomida 10 mg”;
8) medicamento Olaparib 150mg;
9) medicamento Topotecano;
10) medicamentos Pertuzumabe (Perjeta) e Trastuzumabe (Herceptin);
11) medicamento Vandetinibe;
12) medicamento NIVOLUMAB;
13) medicamento Cabozantinibe;
14) medicamentos Entresto 24/26mg e Concardio 5mg;
15) medicamentos Sofosbuvir e Simesprevir.
Tais medicamentos costumam ser empregados em doenças graves e/ou gravíssimas tais como câncer, insuficiência renal crônica, insuficiência cardíaca, insuficiência pulmonar, diabetes, dentre outras, podendo, inclusive, ser aplicado modernos tratamentos, mesmo que não previstos ao tempo da contratação, tal como implante transcatéter de válcula aórtica (TAVI).
A Ministra Nancy Andrighi (Superior Tribunal de Justiça) magistralmente esclarece que “ 7. Quem decide se a situação concreta de enfermidade do paciente está adequada ao tratamento conforme as indicações da bula/manual da ANVISA daquele específico remédio é o profissional médico. Autorizar que a operadora negue a cobertura de tratamento sob a justificativa de que a doença do paciente não está contida nas indicações da bula representa inegável ingerência na ciência médica, em odioso e inaceitável prejuízo do paciente enfermo”.( (REsp 1769557 / CE, RECURSO ESPECIAL 2018/0255560-0, em 13/11/2018).
Desse modo, é de suma importância que ao contratar um plano de saúde o consumidor do plano observe no contrato as coberturas oferecidas e causas limitativas de cobertura, que são discutíveis, e consulte um advogado de sua confiança para esclarecimento de dúvidas antes da assinatura do contrato ou quando houver negativa de cobertura de tratamento ou fornecimento de medicamento.